PANTERA NEGRA: CRÍTICA
Com sua estreia na Fantastic Four #52, em julho de
1966, Pantera
Negra comprovava mais uma vez a capacidade dos quadrinhos de
captar a situação social ao traduzir em cores e ação o Movimento pelos Direitos
Civis nos EUA. Mais de 50 anos depois, o herói ganha seu filme solo não apenas
para atender à necessidade por diversidade e representatividade no cinema. Pantera
Negra é um manifesto cultural, sem medo de falar sobre as
questões raciais nos EUA, passadas e atuais, ao mesmo tempo em que faz um filme de
super-herói empolgante e universal.
Ryan Coogler, o
diretor (também responsável por Creed:
Nascido para Lutar e Fruitvale
Station: A Última Parada), diz que, apesar da estrutura de blockbuster,
esse é seu filme mais pessoal. “Para
mim, lida com a pergunta que tenho me feito desde que era jovem: o que
significa ser africano?”, explica. O aprendizado do cineasta, que
escreve o roteiro ao lado de Joe
Robert Cole, é traduzido no encantamento por Pantera Negra e seu
universo. A “fórmula da Marvel” se torna uma oportunidade de gritar mais alto,
permeando a linguagem preestabelecida por um poderoso subtexto.
Até mesmo o vilão, uma questão problemática no
universo cinematográfico da Casa das Ideias desde Homem de Ferro (2008), é
usado a favor da trama. Erik Killmonger (Michael B. Jordan) é o reflexo de T'Challa
(Chadwick
Boseman), mas Coogler subverte positivamente o clichê do herói
contra si mesmo para estabelecer um paralelo rico e oportuno. Killmonger não é apenas um obstáculo a
ser superado para que o Pantera acredite na própria força. Ele é o outro lado
da moeda, uma oportunidade de reflexão sobre o legado de Wakanda e o alcance da
sua responsabilidade. As ações do passado, tomadas por T'Chaka (John Kani)
e N'Jobu (Sterling K.
Brown), o pai de Killmonger, reverberam no presente, mas cabe a
nova geração levar a nação adiante. Da sua imagem espelhada, T'Challa confronta
erros para ser não apenas um herói, mas um líder melhor.
Esse peso social que Pantera Negra carrega em
cada cena, desde o prólogo que explica em minutos todos os conceitos
necessários para o entendimento da história, não interfere na sua capacidade de
entreter. Com um
roteiro redondo, Clooger e Cole posicionam personagens e situações
para encontrar leveza. Shuri (Letitia Wright), a irmã mais nova de
T'Challa, Garra Sônica (Andy Serkis), o vilão apresentado em Vingadores: Era de Ultron, e o
agente Everett K. Ross (Martin Freeman) são responsáveis pelo humor
mais descarado, mas
a boa construção dos personagens evita que as piadas sejam gratuitas. É o que também explica
a ausência de coadjuvantes descartáveis no filme. Um micro universo é criado em
torno da espiã Nakia (Lupita Nyong'o), da líder das Dora Milaje
Okoye (Danai Gurira),
dos guerreiros M'Baku (Winston Duke) e W'Kabi (Daniel Kaluuya),
e da rainha-mãe Ramonda (Angela Bassett), de forma que suas
existências não se limitam às necessidades do protagonista. Mais do que criar
Wakanda, é preciso povoá-la.
A consistência dada aos personagens pelo
roteiro e as atuações contorna a insegurança de Coogler ao trabalhar com
efeitos visuais. Fica
claro no contraste entre as cenas externas em Wakanda e nas ruas da
Coreia do Sul que o diretor fica mais à vontade em espaços práticos e urbanos,
onde dá agilidade às cenas de ação, seja em um cassino clandestino ou em uma
perseguição de carros. Quando precisa lidar com o Chroma Key para dar vida ao
país fictício, os cenários perdem a profundidade, a câmera não se arrisca,
tornando óbvio o uso da computação gráfica. Cabe ao colorido figurino de Ruth E. Carter,
baseado nas artes de Jack Kirby, a tarefa de dar personalidade à
nação, criando tribos e líderes para um mundo tão tecnológico quanto ancestral. A trilha de Ludwig Göransson,
com consultoria musical de Kendrick Lamar,
também trabalha dentro desse conceito, misturando sons convencionais e músicas
africanas.
Coogler encara Pantera Negra como uma declaração da importância do imaginário na formação de uma sociedade plural e inevitavelmente faz um filme histórico. Seu herói é forte, ágil, justo e está pronto para ser admirado por uma geração de crianças e adultos e se tornar uma das figuras centrais no futuro do universo cinematográfico da Marvel.
Nenhum comentário:
Postar um comentário